Saturday, July 08, 2006

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Sunday, June 18, 2006

Tuesday, April 25, 2006

cravos

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Foi tudo um bocado de céu, tristemente azul, com cravos vermelhos a animar.
Houve tempos em que o que pensava saia com a força do som do tambor, tinha a convicção, sabia o que era a força da revolução!
Agora digo que SIM. Ou que NÃO. A boca diz só o que digo. Sei que digo o que quero. E tu dizes o que queres. Mas os tempos são difíceis, nem sempre digo que sim, ou que não, convencido do que digo. Falta-me, ao dizer as coisas, aquela força da convicção. A força da revolução.
Depois do adeus, depois de toda essa força, sobrou este Abril que temos, 100 tempestades, 100 paixões. Agora, entre nuvens baças, que é da cor dos cravos?
Sinto que foi tudo um bocado de céu. Tristemente azul. Com cravos vermelhos.
A animar.

sexta-feira

A sexta-feira é o sexto dia da semana. Este dia era dedicado pelos pagãos a deusa Vênus, por isto em espanhol o dia é chamado de Viernes (uma derivação de Vênus).
Os nomes dos dias da semana em português têm a sua origem na liturgia católica. Na maior parte das outras línguas as origens são os nomes dos deuses pagãos aos quais os dias eram dedicados; no francês-vendredi; no italiano-venerdì; siginficam apenas dia de vênus.
Vênus é a deusa do Amor e da Beleza. É de uma anatomia divinal, sendo considerada pelos povos antigos, gregos e romanos, como a deusa do erotismo, da beleza e do amor.
brilhante Vênus ao lusco-fusco
Vênus é também, na maior parte do tempo (depois da Lua), o corpo celeste mais brilhante no céu ao anoitecer (ou pouco antes de anoitecer). O facto de Vênus só aparecer nestas alturas tem a ver com o facto de estar entre a Terra e o Sol. Vênus é o objecto mais brilhante no céu, depois do Sol e da Lua. É 13 vezes mais brilhante do que a estrela mais brilhante, que é Sírio.
(in Wikipedia)
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filme real


O Oliveira chega a casa bem tarde para não ter de ver a família e sai de manhã cedinho para estar a horas no trabalho.
Sabe, de uma forma ou de outra, que a terra gira, em movimentos de rotação sobre sí mesma e também sabe que, de uma forma ou outra, ela gira, estilo bola, rodando o sol.
Os filhos não devem saber destes factos cosmológicos mas a mulher do Oliveira tem de certeza uma ideia de todo este giratório.
"As coisas são o que são", esta é a maior verdade para o Oliveira, que sabe que a terra gira, neste desassossego, mas não descobriu ainda porque não gira ele pela vida com aquela leveza que vê em certas pessoas, que são espécies de cometas giratórios, que vemos atravessar-nos, fantásticos, ao longe...e depois reaparecem com toda a plenitude.
"As coisas são o que são", resigna-se o Oliveira, no giratório a caminho do emprego. Afinal ele também gira, também ele tem um movimento constante, diário, uma sina giratória; não é a família, nem os amigos, nem qualquer arte ou hobby...é simplesmente aquele girar diário, de casa para o trabalho, bem cedinho, e à noite de volta a casa, bem tarde, para não ter de ver a família. Porque "As coisas são o que são", nem vale a pena entendê-las, cada um gira como pode e sabe e ele, de tanto girar para casa tarde, já nem conhece os filhos ou a mulher. Ele tem de girar para ter uma casa, planeta inóspito que gira cada vez mais para longe.
"As coisas são o que são", põe-se o oliveira a matutar, pensando porque gira ele todos os dias de volta para aquela sina do trabalho...bem, não é por especial prazer, pois nem faz nada que o deixe feliz ao fim do dia. Arruma as papeladas, trata dos faxes e do inferno dos emails que ainda não entende bem como funcionam. Enfim, "As coisas são o que são" e qualquer dia mandam-no embora, porque "está desactualizado, é caduco, ultrapassado, não vale um chavo".
Essa é uma constante da vida, também o sabe o Oliveira, que está agora preocupado com o fim da sua sina giratória...mas a dúvida persiste, não tem solução; afinal porque gira todos os dias de volta para aquela sina? Bem o Oliveira não é inconsequente e sabe bem que tem de bulir naquele giratório, para pagar as contas, a luz, o carro, mais a casa inóspita e uma infinidade de escravaturas que nos consomem a nós, habitantes deste planeta giratório. O que é certo, pensa o Oliveira, é que tem de rodar neste giratório, como a terra tem de rodar em roda do sol porque "As coisas são o que são"...


"A única diferença entre um filme e a vida real, é que o filme tem que fazer sentido!"

Joseph L. Mankiewicz
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sombras


"Sei que este mundo não vai acabar amanhã. Mas e se acabar? E se este meu julgamento precoce estiver errado e amanhã, bem cedinho, toda esta esfera se desvanecer num milésimo de segundo !?"
Eram estes os pensamentos que ocupavam o Renato, enquanto abria uma cerveja e olhava para a TV, que debitava eloquentemente "no início havia apenas uma pequena porção de matéria altamente concentrada que explodiu..."
Parece que tudo nasceu de uma explosão criadora. E se tudo acabar amanhã numa explosão altamente concentrada ? Bem pelo menos "vai ser bué de desconcertante, acaba tudo e nem aparece na TV..." pensou o Renato e deu por encerrada esta amarga incerteza, em que o Génesis e o Apocalipse se tocavam.

Mudou de canal e a TV de súbito disse:
-Dêem-lhes um controlo remoto e uma grade de cerveja e ninguém os pára.
Era "Bingo!". Assim de repente, toda a história natural fez sentido; como se uma luz tivesse iluminado e revelado, por fim, o propósito de tão complexa evolução natural. No início havia apenas uma pequena porção de matéria altamente concentrada que explodiu. Depois uma lama, altamente reactiva e biológica, deu origem aos primeiros organismos unicelulares. Apanhando toda a gente despercebida, alguns saem da água (já no formato crocodilo simples)e começam a ganhar pêlo e a subir as árvores...das árvores até ao sofá foi um pulo.
É tão simples! E agora;"dêem-me um controlo remoto e uma grade de cerveja, e ninguém me pára" pensou o Renato, refeito dos momentos apocalípticos, com este sumário mordaz.
Correu para o quarto satisfeito com a sua alegre tirada.
Mas o fatalismo teimava em ser o seu companheiro nocturno. " Mas e se acabar? E se o mundo acabar amanhã, entre uma bola de poeira estelar... num acabar fulminante?!" pensava de novo o Renato, enquanto apagava a luz e entrava na cama.
Apreensivo, passou num ápice de expoente máximo da evolução natural, a uma simples criatura... vergada perante mistérios de que não vislumbrava nem a mais infinita e ridícula parte. Sentia-se, de repente, um pobre e triste átomo, arredado de toda a sabedoria criadora universal.
"As sombras do passado são as sombras do presente" concluía o Renato enquanto, por sobre ele, de olhos bem negros, a noite se agigantava. " O passado é inútil como um trapo...tem pêlo e sobe às árvores".
Eram vozes, almas penadas, que lhe gritavam dentro da cabeça:

"O vento de Hollywood em uivo
A queda do Kremlin
A rádio estática
A noite silenciosa
É um prazer...
O Stalin sorri
O Hitler ri
O Tse-Tung de mão nas costas
O Churchill bate palmas
Do nada depende tudo
O passado é inútil como um trapo
Tem pêlo e sobe às árvores"

Todo o passado eram sombras que cresciam, pela noite escura, debaixo dos móveis do quarto. Eram as esquinas sombrias, eram todas as sombras de Apocalipses passados que cobriam os lençóis.
"Toda esta tripe deve ser provocada pela cerveja e pela TV" suspirava atónito o Renato, sem sossego. Era o medo, o não querer morrer na condição de átomo rídiculo e solitário!
Acendeu a luz e com o fugir das sombras, sentiu, lentamente, a calma a voltar. Enfim, lembrou-se do que lhe diziam quando era miúdo e o atormentavam fantasmas ou monstros de quarto escuro; "...repara que não deves ter medo do escuro, porque na verdade é o escuro que tem medo de ti. Vê agora, Renato, como o escuro foge de ti quando acendes a luz. O escuro esconde-se, cheio de medo, debaixo da cama, debaixo dos móveis...", dizia-lhe a mãe, enquanto acendia a luz. E ele comprovava, com grande alívio, que era verdade; assim que a luz se acendia o escuro fugia rapidamente, como por medo, para debaixo de onde se pudesse esconder à pressa. O escuro tinha medo dele.
Adormeceu, por fim e pediu um desejo; que o dia seguinte fosse de luz e que essa luz viesse como um abraço para as sombras da solidão.
Lá fora o dia nascia, entre cores de lusco-fusco. As sombras escondiam-se, pouco a pouco, para debaixo dos carros, das esquinas dos prédios, das pedras da calçada.
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Fico admirado quando alguém, por acaso e quase sempre
sem motivo, me diz que não sabe o que é o amor.
eu sei exactamente o que é o amor. o amor é saber
que existe uma parte de nós que deixou de nos pertencer.
o amor é saber que vamos perdoar tudo a essa parte
de nós que não é nossa. o amor é sermos fracos.
o amor é ter medo e querer morrer.

“A Criança Em Ruínas” de José Luís Peixoto

reprodução



O Joaquim tem uma namorada, a Alberta, que mora bem longe. Namoram há 9 anos numa prática de namoro telefónico, daquele género que só permite encontros de mês a mês, ou ainda pior, de três em três meses. De qualquer forma são namorados, pelo menos é o que o Joaquim diz a toda a gente.
Partilham os dois, claro está, o genoma humano, ou seja, têm em sí as instruções de montagem que permitem a reprodução.
O grande problema dele, para além da distância da namorada, é o facto de a sua Alberta ter tentado um emprego longe. Mas quando digo longe não é com exagero, porque a rapariga concorreu a uma proposta de emprego na Madeira, o que a colocaria ainda mais longe do Joaquim.Foi uma atitude "muito à frente" da Alberta, não se cansava de dizer o Joaquim.
"Era tão à frente" que ele não perdoou; alinhavou-se nele a ideia de que nunca mais poderia construir um futuro sólido, um daqueles futuros de comprar casa, juntar os trapinhos e ver no que dá a vida em conjunto; talvez mesmo iniciar o processo de montagem de pequenos Joaquinzinhos num desses bairros viveiros ao redor da capital; os Humanos têm sido criados em cativeiro nas mais diversas condições, desde viveiros de 1,5 m X 2 m X 1,5 m, até viveiros com 5 a 6 m de comprimento nesses bairros periféricos, portanto nada havia de mais nos planos do Joaquim, nessa sua visão da vida em bando.
O Joaquim, que antes se via como construtor universal de Joaquinzinhos com a sua Alberta, não hesitou. Logo que soube do propósito da namorada de ir trabalhar para a ilha, acabou tudo com ela, "na hora!", "com toda a certeza do que estava a fazer!". Porque tal pretensão da Alberta só poderia significar que ela não pensava nos mesmos termos que ele; "ela era muito à frente", não tinha como objectivo comprar casa ou juntar as heranças genéticas. O Joaquim andou uns dias com a firme convicção de que tinha acabado tudo com a Alberta, apesar de ela lhe ligar todos os dias; a tentar amainá-lo, a tentar explicar-lhe que a vida é difícil, que tinha de ir senão nunca mais arranjava emprego de jeito, que ele não estava a perceber a situação dela...enfim, que eram nove anos de namoro!
Por fim, os argumentos dela algum efeito tiveram no Joaquim, porque a Alberta passou de novo a namorada, mas houve nele um inferno que nunca se resolveu com toda esta ideia do Funchal. Ela nunca chegou a ir trabalhar para a Madeira, mas o Joaquim não se cansa de dizer que tem de mudar de rumo, que ela é gorda e tem mau feitio, que só está à espera de arranjar outra, com melhores cromossomas, para a largar, mas o que mais irrita o Joaquim é que "ela é muito à frente"...


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